quinta-feira, 27 de novembro de 2008

As pedras pensantes de Constantin Brancusi

O jovem Constantin Brancusi recém chegado a Paris, tratou de procurar urgentemente, um lugar para morar e um lugar para estudar! Não se sabe bem por que, mas o candidato a escultor não foi nada temeroso, como normalmente seria um jovem tímido vindo do interior da Romênia! Foi à luta!

Perguntou aqui, se informou ali, e decidiu-se por um atelier de Paris, onde despontava como responsável um tal Auguste Rodin! Até aí, corria tudo bem, nevava na capital francesa!


Brancusi saiu cedo do pequeno quarto onde estava hospedado, atravessou La Pont Neuf correu atrás de um bonde e finalmente chegou às portas do prédio onde funcionava o efervecente atelier de Rodin, Camille e companhia!

Qual não foi a sua surpresa, quando percebeu que não estava só em sua maratona matinal! Havia pelo menos umas 50 pessoas entre jovens moças e outros já de meia idade, esperando na calçada defronte ao famoso prédio! Constantin olhou para os lados, deu uns quatro passos para trás a fim de olhar o alto da porta central, para ver se havia algum engano de sua parte! Mas não, ele certificou-se lendo com certa dificuldade, " L'Atelier Villa des Brillants"!

Desfeito o suposto engano ficou de pé ao lado da porta olhando o movimento dos funcionários que começavam a chegar para o trabalho!

Num dado momento um homem vestindo um guarda-pó, começou a anotar os nomes das pessoas que ali estavam! Brancusi bem que tentou se adiantar, mas acabou ficando por último da fila para o questionário!

O homem do guarda-pó já demonstrava uma enorme exaustão ainda quando havia quatro ou cinco pessoas para entrevistar antes do romeno! Revirava os olhos, entortava a boca e suspirava a cada resposta dos entrevistados! Quando chegou a vez de Brancusi então, o homem estava nas últimas!

Fazia muito frio! Constantin agarrado na sua sacola, dava pulinhos para tentar manter a temperatura. O homem nem tentou decifrar o sobrenome do jovem, o primeiro nome já foi um pesadelo para ele, mesmo com toda a semelhança ao francês!

Aí então é que Constantin ficou sabendo a razão pela qual estavam aquelas pessoas a esperar com todo aquele frio! Era o "le jour d'entré dans l'atelier" Isso se passassem nos famosos testes de Auguste Rodin! O dia de entrar para o atelier, era conhecido em Paris! Até a imprensa especializada acorria ao local para divulgar a movimentação e os resultados! O próprio Rodin fazia questão de anunciar o nome dos candidatos aprovados!

Alguns nomes famosos já haviam passado pelas portas daquele prédio! Nomes como de Aristide Maillol, talvez o aluno cujo trabalho mais tenha se aproximado do grande mestre e a própria Camille Claudel, que infelizmente só ficou famosa meio século mais tarde!

Enfim chegara a vez de Constantin Brancusi, ninguém estava tão ansioso dentro daquele prédio!

O jovem agarrava com tanta força a sua sacola que os dedos já estavam ficando vermelhos!

Constantin colocou a sacola sobre a bancada, donde do outro lado sentado confortavelmente, estava o grande mestre observando o nervosismo do rapaz! Assim que o conteúdo precioso da sacola foi revelado, Rodin baixou os olhos e ergueu rapidamente até encontrar os do moço arregalados como dois dobrões!

-Mas o que é isso? Indagou o artista meio vermelho.

-Pedras senhor! Respondeu o garoto gaguejando.

-Que são pedras eu sei! Quero saber o que elas estão fazendo aqui na minha mesa?

-Bem senhor! Acho que elas estão aí.. pensando!

-Pensando? Essas pedras pensam? Perguntou Rodin já totalmente vermelho.

-Sim senhor elas pensam sim!

-Ah é? E o quê elas estão pensando agora?

-Bem! Eu não sei elas não me disseram ainda!

-Bom então pergunte!

-Para quem?

-Para as pedras ué! Gritou o mestre abrindo os braços.

-Perguntar o quê senhor?

-O quê que elas estão pensando, imbecil!

-Mas o senhor acredita mesmo que uma pedra possa pensar?

-Eu não, você é que pensa que elas pensam!

-Mas sou eu que penso então?

-Não idiota, as pedras é que pensam!

-É mesmo? O senhor acha é?

-Eu não seu maluco, são as pedras!

-Mas foi senhor quem disse!

-Disse o quê? Que essas pedras idiotas pensam ?

A essa altura da conversa, Rodin já não estava apenas gritando! Do outro lado de Paris, era possível saber o que acontecia naquela manhã fria de inverno! A imprensa que acompanhava atenta àquela insólita discussão, já estava preparando as manchetes para les journal du soir:

" Auguste Rodin ouve conselhos de pedras pensantes trazidas da Romênia pelo jovem desconhecido Constantin Brancusi. Ninguém sabe o quê as fenomenais pedras disseram ao mestre, nem mesmo o próprio Brancusi"

O jovem romeno acabou não sendo aprovado para entrar no atelier de Rodin! Ele foi seguir seu caminho isolado, longe dessas agitações! O ambiente do atelier não lhe agradou, percebeu que as pessoas não tinham domínio de suas faculdades mentais, desde o mestre que acreditava em conselhos dados por pedras e duas alunas que passavam o tempo inteiro tentando matar uma a outra! Enfim foi melhor para ele!

E as pedras? Continuam pensando até hoje, e alguns escultores acreditam.

Ricardo Kersting

Um comentário:

Helena Erthal disse...

Numa roupagem descontraída, a estória consegue passar elementos fortes para reflexão. Quantas vezes pensamos que somente determinado caminho pode nos levar ao sucesso?
Constantin seguiu o caminho pouco trilhado e isso fez toda a diferença. Ele procurou e achou seu próprio estilo, o que significou grandes rupturas e desafios em sua vida.
Como é difícil sermos fiéis a nós mesmos!!!